quarta-feira, 2 de agosto de 2017

O "ROUBO DE TANCOS"

ROUBO NOS PAIÓIS



Ao ouvir num canal televisivo,
dois ex-capitães de Abril (Sousa e Castro e Vasco Lourenço)
dizer o que julgavam acerca do tão badalado
Roubo de Tancos

lembrei-me de alguns factos que constatei na Siderurgia Nacional do Seixal "Empresa onde trabalhei" e que descrevo, porque acho que podem ajudar a entender o pensamento dos referidos.

Recordo que nos Armazéns da Siderurgia Nacional
após os balcões de atendimento, como é normal em todos os Armazéns de Materiais, era estritamente proibida a entrada da generalidade dos trabalhadores.
Só a eles tinham acesso os Fiéis de serviço, excepto como é óbvio, casos pontuais*.

Se o Fiel de Armazém estivesse ausente do balcão, os trabalhadores aguardavam a sua presença após tocarem a campainha de chamada, existente para o efeito.

Os portadores das respectivas requisições de materiais (devidamente autorizadas pelas chefias que já tinham confirmado nos livros, a existência dos mesmos) entregavam-nas aos Fiéis de serviço, que por vezes desapareciam nos emaranhados corredores e mais corredores prateleiras e mais prateleiras, quase sempre (fazendo lembrar o paciente "impaciente" num consultório) até que, resignadamente e ao fim de um bom tempo de espera, lá surgiam com o material requisitado.

Certos materiais eram guardados a sete chaves por serem bastante cobiçados,e considerados
 "uma tentação"

Eram os de uso mais comum ou de maior valor monetário, tais como entre muitos:
as vulgares e tradicionais pilhas, os tinteiros das impressoras a cores, as folhas de papel fotográfico, marcadores edding 3000, pequenos acessórios em materiais mais valiosos, exemplo das varetas de cobre electrolítico puro (Material de que também são feitas a grande maioria das pontas dos bons ferros de soldar, um autêntico ouro em qualquer sucateiro), outros em "prata pura" como as membranas das válvulas do cloro, das válvulas de segurança do Nitrogénio, etc etc.

Outros existiam não tão cobiçados, cuja existência nas prateleiras algumas vezes pouco ou nada tinham a ver com a quantidade registada nos livros.

Eram os casos das Correias trapezoidais pequenas, com dimensões iguais às usadas nos automóveis da rapaziada. Das lâmpadas fluorescentes de tamanhos mais correntes em uso nas casas de qualquer um, dos super-conhecidos acessórios galvanizados de 1", de 3/4" ou de 1/2" polegada, do cartão hidráulico de espessura ideal para fazer as juntas dos motores nos carros, as bobines de fio de cobre para bobinagens, etc etc.

Em quase todos os armazéns Sectoriais mais ainda no Geral, estes materiais “sem justificação aparente” tinham por vezes a existência bastante inferior ao devido.
Contrariamente ao que acontece em qualquer “boteco” aqui era impossível na altura da rendição conferir o material existente, que eram aos milhares de artigos.

 Os Fiéis de Armazém baseados na responsabilidade e confiança, assumiam com naturalidade o seu turno, ignorando se o colega anterior por engano ou por ter DESENRASCADO UM AMIGO, alterou aquilo que o computador central irá imprimir baseado nas saídas "justificadas" na próxima atualização dos livros de existências.

Nos largos anos que lá trabalhei, não foram raras as vezes que ouvi um Fiel dizer a alguém: 
Oi camarada. Para Me desenrascares Não TE importas de levar menos quantidade, do que aquela aqui pedida?

Cheguei mesmo a ouvir:
NÃO HÁ MEIO DE HAVER UM BENDITO ASSALTO, PARA AS EXISTÊNCIAS SEREM ACERTADAS.

Ora aqui estava "há cerca de 20 anos" a ideia e uma maneira simples,
de resolver o problema

Eis agora o que à posteriori estes dois Ex-Capitães escreveram:

Um artigo do coronel Sousa e Castro.

E SE EM TANCOS NÃO TIVESSE HAVIDO, NEM ASSALTO, NEM ROUBO NEM FURTO.?
(divagações de um cidadão, num domingo invernoso em pleno verão)

Deixemos o pequeno buraco na rede da cerca do quartel e o arrombamento sem violência da porta do paiol como peças para finalizarmos o puzzle que nos “atormenta”.

1 – Todo o material em falta é material perecível, isto é, não existe uma única espingarda, metralhadora, revólver canhão ou lança mísseis no rol das faltas. Nem sequer um cinturão ou qualquer outra peça do fardamento e equipamento.
Por outras palavras, e clarificando, perecível quer dizer que todo este material em falta, era e sempre foi usado em exercícios militares de rotina ou imprevistos e gasto ali mesmo devendo em bom rigor ser abatido à carga, do paiol ou armazém onde foi requisitado logo após cada exercício.

Era esta prática corrente e usual na tropa do meu tempo. Mas também havia graduados, oficiais, que muitas vezes passavam por cima das dotações estipuladas para cada exercício e descartavam os “resmungos” dos subordinados responsáveis pelo municiamento abusivo extra, com dichotes e palavrões. O resultado era, quem tinha requisitado o material excedido no exercício não o abater e depois, raciocínio comum à época, “logo se veria”.

2 – Para esclarecer cabalmente a natureza “perecível” do material em falta é necessário desmi
stificar a forma ignorante com que muitos, e até alguns experts, quer em jornais quer nas TV´s, induziram na população, a ideia que o material em falta incluía armamento e mais grave mísseis.
Desmontemos pois esta cabala para podermos prosseguir.
a ) Da lista oficial de faltas consta uma munição, impropriamente chamada pelos tais experts, de lança míssil ou míssil, mas que se resume a uma granada anti tanque, lançada de um tubo articulado que após o lançamento é descartável e não reutilizável , tal como acontece com o cartucho que contém a pólvora que provoca a saída duma bala. Tão simples como isto.

Na verdade é uma arma que só pode ser utilizada uma vez, tal como qualquer granada.
Para quem se interessa por estas coisas trata-se de um filhote dos panzerfaust nazis, que até uma criança podia lançar.

Acresce que esta arma, cuja sigla é LAW ( Lhigt anti-armor weapon) foi retirada do serviço em 1983, portanto há TRINTA E QUATRO ANOS e o seu fabrico descontinuado como agora se diz. Com o ridículo alcance de 200 metros e sem sistemas de guiamento autónomos foi naturalmente substituída por misseis de muito maior alcance, guiados por fio ou wireless através de lançadores esses sim, sistemas não descartáveis e de grande valor bélico e financeiro, como o míssil TOW ou o MILAN.

Presumo até que se alguém quisesse negociar no mercado internacional esta arma, não só não teria êxito, como seria alvo de chacota, incluindo dos rapazes do DAESH que estão armados até aos dentes com o armamento mais moderno que há.

Estando em uso no Exército anos e anos a fio fácil é admitir que toda a gente se estaria ca….. como se diz na gíria militar para o seu consumo excessivo e para o acerto das cargas.
b) Todos os outros materiais em falta eram e são obviamente utilizados e consumidos integralmente em exercícios de treino.
3 – Antes de fechar o puzzle uma pergunta que julgo ser a pertinente face ao acontecimento:
- Se havia paióis na zona, vizinhos do “violado”, com certeza com armas sofisticadas, incluindo os tais misseis TOW e MILAN, além de armamento de infantaria pelo menos com valor militar actual, porque foram os hipotéticos assaltantes abrir a porta do paiol com fraco valor.

Não é por acaso que o comentário do secretário geral da NATO a este desaparecimento de material foi a consideração da sua irrelevância.
4 – Acabemos agora o puzzle juntando as ridículas circunstância do pseudo roubo. O buraco na rede e o arrombamento discreto.

Coisa fácil de fazer para quem, acossado pela iminência da entrega do espólio e da prestação de contas das existências tenha sido impelido a optar pela diversão naif.

Boa sorte aos investigadores da PJ e PJM
Do Coronel Vasco Lourenço…

FURTO DE MATERIAL DE GUERRA EM TANCOS

Em primeiro lugar, esclareço a opção por “furto” e não “roubo” ou, muito menos “assalto”.
Opto por furto, pois para haver roubo é necessário que haja violência no furto e só com violência específica é que passa a haver um assalto. Ora o que nós temos pela frente é um simples desaparecimento de material, sem qualquer evidência de violência no facto.

O presumível buraco na rede de protecção não passa disso mesmo, um simples buraco, e não convence ninguém de que não foi posto apenas para disfarçar.

Por isso, a história está, de facto, muito mal contada e é urgente que a vontade expressa pelo Presidente da República se concretize: esclarecer tudo, rapidamente, doa a quem doer!
Nesse esclarecimento, há que dar respostas a questões que se colocam, vindas de diversos quadrantes:
·         Quando se deu o desaparecimento do material?
·         Como desapareceu? Todo de uma vez ou, como muitos opinam, por várias vezes e durante um espaço concreto de tempo? E, neste caso, durante quanto tempo durou o desaparecimento do material?
·         Hipótese mais grave ainda, o material desaparecido chegou a entrar nos paióis ou foi apenas acrescentado à carga dos mesmos?
·         Nestas duas hipóteses, do desaparecimento por várias vezes ou do simples aditamento à carga, de quem foi a responsabilidade da operação, desde o desaparecimento à decisão de acertar as cargas do paiol?
·         No caso de um furto de uma só vez, como foi transportado o material?
Haverá outras questões a necessitar de resposta, mas estas impõem-se desde já para se compreender toda a trama do “assalto aos paióis de Tancos”....

(Mais havia para colocar, mas por ser extenso ficamos por aqui.)

E termina dizendo:
.... É que essas Forças Armadas são demasiado importantes para Portugal, para que permitamos que alguém brinque com elas! Isto, acreditando, como acreditamos, que as mesmas continuem patrióticas e a ser o principal sustentáculo do regime democrático em Portugal!
Por mim, continuo confiante na Democracia.
Vasco Lourenço


Voltando à Siderurgia e a título de curiosidade:

Por causa do "gamanço" e à medida que se iam fundindo, foram sendo substituídas as largas centenas de lâmpadas fluorescentes do Canal principal de Cabos  (um Canal subterrâneo estreito, com altura suficiente para uma pessoa, que além dos cabos de Alta Tensão que interligavam duas Subestações Eléctricas, também continha tubagens de diversos fluídos. Um autêntico bunker com mais de 1000 metros),
por lâmpadas incandescentes de baioneta.

Recordo que “há bué bué de tempo” e pelo mesmo motivo, esta política tinha sido já adoptada pela CP. Substituíram nas carruagens, todas as lâmpadas de incandescência normais de casquilho Edison, pelas ditas de casquilho de baioneta e mais ainda... com grelhas de protecção.



Um Casquilho adaptador. Baioneta/Edison



* Casos Pontuais
(*) Lembro-me de entrar no armazém Geral algumas vezes em "casos Pontuais" das quais destaco duas que não esqueço.

Foi para fazer um Desenho em Perspectiva para mostrar aos Fiéis o aspecto “sui generis”, que teriam dois pequenos mas valiosos casquilhos, que os livros diziam existir em stock, mas que na realidade, na prateleira existia somente pó.

Dado o seu pequeno tamanho e aspecto invulgar, todos concordaram que os mesmos não teriam sido "roubados" por alguém. De certeza que não estariam já à venda na Feira da Ladra.

Ninguém diria que o material nobre de que eram feitos, fosse super-especial.
Por não poder usar rolamentos, tratavam-se dos casquilhos de reserva da Bomba Principal do Oxigénio Líquido (cuja temperatura de trabalho, ronda os 190º Negativos) da Central de Oxigénio.
A Central tinha parado por uma coisa aparentemente "tão insignificante" mas importantíssima, era pois obrigatório que aparecessem.


Duas ou três horas depois, um responsável do armazém perguntou-me:

Sr. Pimenta. Quantos Quer?. Ao que respondi: Somente os dois constantes nas listas.

Rindo disseram-me... Mentira..Encontramos quatro
"e agora o problema, vai ser justificar o Porquê."
Outra peripécia, foi para encontrar
o 
“Turbo de Reserva” de um Gerador de Socorro a Diesel.

Este estava a ser reparado numa firma da especialidade. Da firma, telefonaram-nos dizendo existir um grave problema: o Gerador tem o Turbo “pifado”.

Consultadas as listas, respirou-se de alívio, já que existia um em Stock.
Feita a respectiva requisição urgente, alguém rumou ao Armazém Geral para levantar o mesmo.

Quando todo o mundo esperava que esse funcionário já estivesse a caminho de Lisboa, demos conhecimento à firma de que o mesmo estaria a chegar,
mas pouco depois, tocou o telefone interno dizendo:
Sr. Pimenta, no armazém não encontramos esse material.

Confrontados com o problema, todo o pessoal “Fiéis e infiéis” quase viraram o Armazém do avesso.
Pelo sim e pelo não "mesmo sabendo que custaria uma pipa de massa" telefonou-se para França “directamente para o fabricante” que por acaso tinha um Turbo disponível.

(o motor tinha mais de 30 anos de idade)

Como entretanto no Armazém ninguém encontrava nem vestígios da embalagem, deu-se luz verde para a compra imediata do dito. Foi expedido em “Grande vitesse”, e rapidamente o tal Diesel de Socorro, ficou “pronto a socorrer”.

Uns meses passados toca o telefone. Era o Big Boss do Armazém.

Pimenta?. Lembra-se daquele turbo que não apareceu?...
Pois acaba de ser encontrado!? E sabe onde?...
A servir de escalfeta.

Para não pousarem os pés directamente no cimento por causa do frio e por ser bem há medida, algum dos fiéis meteu o caixote debaixo na secretária.
hehehehe
Uma Nota clarificadora: Chegamos a ser mais de 5000 Siderúrgicos, e a maior parte dos desaparecimentos surgiram, quando começaram  a ser frequentes as adjudicações dos trabalhos a Empreiteiros.