quarta-feira, 17 de julho de 2013

A Carta de Condução

Ao descobrir que existiu uma “luta acesa” nos comentários da história (Que Deus me perdoe, mas tinha de ser assim) defendendo aqueles que tiraram a carta no ultramar, apraz-me dizer algo sobre o assunto.

Como contei na do (Crocodilo-Dange), fui evacuado para Quibaxe.



Fiquei assim internado na enfermaria do quartel de transmissões, para me curar de um paludismo “galopante”.
Aqui fiz amigos, e vivi intensamente os poucos dias da estadia.
Testemunhei entre outras, a história que passo a contar.


Constava-se que na única escola de condução existente na Vila de Quibaxe, se atribuíam cartas de condução a pessoal que nunca tinha frequentado uma única aula. Diziam até que as fotos dos africanos era sempre a mesma, a de um preto qualquer. Para as impressões digitais nem era necessário a presença do visado.

Sinceramente nunca acreditei. O problema era outro:


Vim a saber que permanecia no quartel um camarada Furriel chegado há pouco tempo do mato, cuja permanência era o estritamente necessário para tirar a carta de condução e depois “bazar”.
Já tinha tentado em Luanda mas a coisa fiava mais fino pois chumbara algumas vezes. Ouviu falar de Quibaxe e não sei como, ali estava Ele.

A rua principal era a única "alcatroada". Existiam diversas transversais, todas elas em terra batida




Vista total da "Avenida" da Vila de Quibaxe, a partir da "Camara" 


Era quase noite, e para acalmar bebia umas Cucas. Viemos a saber que embora feliz por ter passado no exame de código feito à tardinha, queria que o tempo parasse.
Não queria o amanhã, porque estava receoso por ser o dia do exame da condução.

Mas eis que o dia seguinte chegou, e todos ficamos a saber as suas limitações. Confessou “e o Furriel mecânico já tinha confirmado” que sabia conduzir com algum à-vontade mas… Aquele maldito “passeio” não o deixava dormir.



Era o único bocado de passeio existente, digno do seu nome. Foi construído de propósito pela Escola de condução (acho que se chamava EVA) para servir de prova e era odiado por todos os instruendos. Quase todos os chumbos tinham como origem as tangentes ou secantes feitas a este.
Em ângulo recto, os condutores ao curvarem para entrar ou sair do apertado trilho que ligava um dos Musseques à rua principal, não podiam “galgar” os cerca de três metros para cada lado, do lancil. Com um raio de curvatura de pouco mais de um metro, denotava grandes mazelas, pois era reconstruido com frequência por ser diariamente tão maltratado .

Como sempre, no dia do exame a tolerância era "zero”. Depois de umas marchas atrás e marchas à frente, um ou dois estacionamentos ocasionais, chegava a vez de contornar o lancil.

A hora marcada estava a chegar, o nervosismo era patente e as Cucas fresquinhas eram constantes.



Um pouco antes, na minha presença ouvi este diálogo:

MAS AFINAL É ESSE O TEU PROBLEMA? Perguntou o furriel mecânico.
Não te preocupes que tudo se resolve.
É pá! Não me digas que conheces o examinador. Perguntou o candidato a condutor.
Qual quê! Boa sorte. Replicou o mecânico.



Como Eu estava “de convalescença” não pude sair do quartel mas fiquei em pulgas para saber o desfecho final.

Só sei dizer que mais tarde, fui convidado para comemorar o êxito.




no topo da "Avenida" a Administração do Concelho dos Dembos
Nota: embora pareça, Eu não sou o Administrador.

Fiquei a saber que o nosso amigo “já conformado” começou o exame. Entretanto, ao dobrar a esquina e no preciso momento da temível manobra, foi “infelizmente” impedido de a fazer porque acontecera um imprevisto.
Por azar, um Unimogue estava parado na curva entupindo o trânsito, com o capô aberto, e um soldado deitado debaixo dele tentando resolver a avaria. Dizia que: ouviu um estouro, devia ter o motor partido.


Saiu debaixo da viatura, e o nosso amigo reparou num piscar de olho com um sorriso dissimulado. Descobriu então, que o soldado de boné enfiado na cabeça e todo sujo era afinal o Furriel mecânico. 



De imediato ouviu o examinador dizer… Siga.



Depois de adiada a manobra, foram feitas mais tentativas no decurso do exame mas em vão. Infelizmente o problema era grave. Tinham de chamar o reboque.



E foi assim que as estradas ganharam mais um Encartado.


Lá diz o ditado… Quem é bom, Já nasce feito.




Esta história tem sido por mim lembrada algumas vezes. Quando se fala em cartas de condução, Eu recordo o dia que tirei a minha, mas em Setúbal. 

Com quase 67 anos de idade, recordo que foi a única vez que chumbei num exame. Tudo corria bem quando o imbecil do examinador travou o carro de repente, insinuando que eu ia fazer uma manobra que nunca me passou pela ideia.

Escusado será dizer que: Se “o altíssimo” ouviu as minhas preces, ainda hoje (mais de 30 anos passados) o parvalhão andará de calças na mão a correr para a retrete com uma diarreia descomunal.
 

 
 

6 comentários:

  1. Achas que era "imbecil", ou insinuava-se para receber uma corrupçãozinha? Totó, nem percebeste!!!

    ResponderEliminar
  2. Naquele tempo os Semáforos quase que não tinham sido inventados.

    Em Luanda existiam alguns polícias sinaleiros, mas em Quibaxe, zero.

    ResponderEliminar
  3. Que ano teve lugar esta historia?

    ResponderEliminar
  4. nasci em Quibaxe e me interssa toda historia da minha terra , por isso ao escrever, por favor não esqueça as datas dos acontecimentos. na Altura em lá chegou, quem era o rei dos Dembos Quibaxe e em que ano? pode me ajudar em saber?

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Para ler a Minha resposta, carregue na Página Inicial. s.f.f.
      Obrigado pelos comentários e conte connosco.

      Eliminar
    2. Pode visualizar a página com o título: QUIBAXE - Terra Natal

      Eliminar