Era um bom companheiro. Paz á sua alma.
Até hoje, quando se
falava de "um certo Furriel", vinha-me logo à ideia o cacimbo e a história da
escova de sapatos puxada pela trela, qual maluquinho de arroios.
Sabemos agora com
exactidão, como tudo se passou, e posso afirmar que qualquer semelhança com
a realidade, tem alguma coincidência.
***
Certa vez, apareceu no
acampamento da 2506, um cãozinho engraçado rasteirinho e muito felpudo “quase
não se lhe viam os olhos”. Era um animal sem pedigree, porém inteligente, que rapidamente
descobriu quem era o Chefe. Feliz, seguia-o para todo o lado mas impedido de
entrar, dormia no tapete fóra da tenda.
Era o xodó da
companhia, até que um dia apareceu deprimido, com aspecto doentio. A
vitalidade outrora exibida, de repente desvanecera. Acabaram-se os cólinhos, os
mimos e as risadas das suas travessuras, porque a doença podia ser perigosa.
Será Esgana? Raiva? Pior ainda?. Iniciou-se
então, uma luta contra o tempo no intuito de fazê-lo espevitar de novo, mas… debalde.
O dia estava abrasador,
talvez perto dos 50º. O animal parecia que estava armado em alentejano, a arranjar lenha
para se queimar. Dolente e sem forças para beber, não reagia aos
estímulos.
Chegou-se “por unanimidade” a uma triste conclusão:
ERA UM CASO
PERDIDO.
Para aliviar o
sofrimento, sabemos agora, que um Furriel Atirador foi incumbido pela chefia, para
uma ingrata missão secreta. Tinha de a cumprir até á hora do almoço, e sem
hipóteses de recusa. Essa missão era nem mais nem menos, “Assassinar a sangue
frio” com um tiro certeiro na mona, o fiel amigo “não confundas com bacalhau”.
Para isso,
podia sair tranquilo do aquartelamento sem receio, porque a sentinela seria avisada
para não reagir, ao soar o tiro.
O dito furriel com receio, não
podendo esquivar-se da missão, "e por serem curtos" reuniu dois bocados de corda.
Pediu depois à
chefia, autorização para utilizar em vez da G3, um pequeno revólver que
possuía.
Autorização concedida.
Com todo o cuidado para
não ser mordido, atou a corda à volta do pescoço do animal e incitou a segui-lo.
Sem obter resposta, resolveu sem mais delongas rebocar o bicho pela trela. Saiu
do aquartelamento, e percorreu a recta de 200 metros, com o animal quase de rôjo
levantando poeira. A meio do caminho, apreensivo, olhou para trás e reparou nos
olhares incrédulos de alguns soldados, que atónitos assistiam à cena.
Finalmente chegou a
curva, um sítio ideal para cumprir sem testemunhas, a execução imposta.
Olhou-o
de frente, pediu desculpas, encostou-lhe o pequeno revolver à testa, virou a
cara e pum. O pobre cãozinho até recuou, talvez 40 centímetros.
Uff... Missão
cumprida; descansa em paz.
**
Iniciou o
regresso, pensando como iam reagir os soldados ao vê-lo chegar só, de pistola à
cinta e G3 ao ombro.
Três passos dados, com remorsos olhou para trás. ??!!. e estremeceu!
Estarei Cacimbado?
Não queria acreditar no
que via; o pobre bicho estava a pôr-se de pé. Aleluia, o malvado ressuscitou. Não
sabia se rir se chorar.
Reflectiu melhor e,
grande chatice. Tinha de viver tudo de novo.
Levantou a franjinha da testa do
animal e confirmou a existência do tiro. Tinha só um furinho, o da frente. Se a
bala não saiu, pelo menos entrou.
Respeitosamente falou
com ele: Perdoa amigo, mas tenho de repetir a dose.
Novo ritual e novo tiro. Não
tanto, mas uma vez mais o bicho recuou.
Será que foi desta? Aguardou um pouco, e
afinal o canídeo insistia em não morrer.
É mesmo um cão de guerra, pensou.
Mas….É pá…Deves estar a
gozar comigo!..
Armado em Rambo, largou a pistola, agarrou na G3 e deu-lhe o
golpe fatal.
THE END.
Era um bom companheiro. Paz á sua alma.
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